O Saco Socrástico

Sócrates era o cara.

Se me permitem, antes de ir para a parte pretensamente humorística desta crônica, farei uma breve introdução (usando preservativo) sobre o que consistia o raciocínio lógico de Sócrates. Farei isso, porque se eu não fizer, esta crônica não terá a menor graça. Aliás, acho que não vai ter graça de qualquer jeito, mas não custa tentar.

 

Sócrates (o filósofo grego, e não o jogador de futebol, viu Carla Perez?) travava seus diálogos com as pessoas em duas fases: primeiramente, a ironia. A ironia consistia em fazer seu interlocutor falar, falar e papagaiar a respeito de um tema que ele JULGA conhecer, mas por não conhecer profundamente, acaba tropeçando nas próprias asneiras.

Em seguida, vem a maiêutica, que é a construção de novos argumentos, fortes e sólidos, usando de um raciocínio lógico para aproximar-se mais do verdadeiro conhecimento.

Por isso o Socratezinho era porreta. Foi, é e sempre será.

Mas imagem o tamanho do saco que devia ter a esposa de Sócrates quando eles se embrenhavam numa discussão de casal. Pra não falar da senhora sua mãe.

Por isso, sem mais delongas...

 

O Saco Socrástico

Diego Gianni

Enquanto isso, em um dia qualquer, na infância de Sócrates, sua impaciente mãe berrava:

 

- Sócrates! Vem tomar café que a carruagem da escola está chegando!

- Já vou, mãe!

- Você está há duas horas trancados neste quarto! O que você está aprontando?

- Nada, mamãe.

- Quem nada é peixe, seu moleque! Vem tomar café!

 

A mãe do pequeno filósofo o puxa pela orelha e o arrasta pra mesa.

 

- Me diz o que você tava fazendo.

- Nada de mais.

- Fala, pirralho metido a besta!

- Eu estava pensando.

- Pensando no quê?

- Pensando. Apenas pensando.

 

A mãe olha preocupada para ele. Ficar no quarto trancado por horas “pensando” é coisa de adolescente. E Socratezinho ainda nem espinhas tinha, o infeliz.

 

- Pensando sobre o que, posso saber?

- Sobre esta bosta toda que a Grécia chama de democracia.

 

Faltou pouco para a mãe lhe virar um tabefe. Não apenas pelo palavrão, mas pela loucura de falar mal do governo.

 

- Menino, cuidado com a boca!

- Mas mamãe...Como pode haver uma democracia com escravos? Uma democracia que respeita as mulheres tanto quanto se pode respeitar um aipo?

 

Daí ela desceu o braço. Sócrates fez beicinho, engoliu o choro e insistiu com determinação:

 

- Este mundo está de ponta cabeça!

- Eu é que vou te deixar de ponta cabeça, seu pivete! Que Zeus nos proteja se alguém ouvir essas suas ideias!

- Eu não acredito em Zeus.

- VOCÊ O QUÊ?!

- Eu não acredito em Zeus e...

 

Meia hora depois, no hospital público da Grécia...

 

- Filho, filhinho amado...Desculpa a mamãe ter te surrado tanto...Mas você é muito novo pra ficar falando essa coletânea de zurrices. Aprenda uma coisa com a mamãe: só gente adulta e rica pode se dar ao luxo de bancar o idiota.

- Tudo bem, mamãe.

- Promete pra mamãe que não vai mais pensar nessas coisas.

- Prometo. – respondeu o menino sorrindo sem os dentes da frente. Mas vendo a mãe mais calminha, perguntou:

 

- Mamãe, quantos anos a senhora tem?

- 45, filhinho.

- E com esta idade a senhora ainda acredita em Zeus?

 

Não houve enfermeira que a segurasse.

Cerca de trinta anos depois, numa tarde ensolarada de domingo, Sócrates e a esposa estão tendo uma “DR” (discutindo relação).

- COMO ASSIM “QUAL É A IMPORTÂNCIA DE DEIXAR O ASSENTO DA PRIVADA ABAIXADO”? – berrou a esposa.

 

Sócrates sorriu, cheio de ironia, e soltou esta:

 

- Pois me diga qual é a importância do assento de uma privada para o mundo.

 

E a esposa falou, discursou, xingou, e por fim viu que estava errada em seus argumentos. Eram sempre assim as discussões do casal.

A mulher estava que não agüentava mais.

 

- Viu só, minha deusa? – sussurrou o filósofo. – Não precisamos discutir por causa disso. Nunca mais.

- É verdade. Por que não tomamos um drinque pra relaxar?

- Beleza. O que vai ser?

- Cicuta.

 

Mas Sócrates não morreu. Ironicamente, morreria envenenado anos mais tarde...Porque no fundo, sua vida inteira, Sócrates falava, falava, falava, e a verdade entre o filósofo e as pessoas que estavam a sua volta, fosse a mãe, fosse a esposa ou fosse o raio que o parta, era uma só:

Sócrates falava grego.

 

 

Diego Gianni

(15/04/2011)

 
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