Modinha

Tenho tendência a gostar de algo até virar “modinha”.

Para ser justo, não é porque alguma coisa vira modinha que deixa de ser boa. O que me incomoda é a sensação de que gosto de algo só porque é modinha, mesmo que eu realmente goste e...ah, é complicado.

Acontece que quando algo vira modinha, dá aquele gosto que a coisa nem é tão boa assim...Porque se fosse, não seria modinha. Entendem?

Mas como estabelecer critérios confiáveis? Se por acaso eu tivesse nascido na década de 60, não gostaria dos beatles porque eles eram modinha?

Elvis Presley foi uma baita modinha. Já Michael Jackson tornou-se modinha depois de morto, pois de repente adolescentes de treze anos passaram a dizer que “amavam Michael desde criancinhas”.

É a teoria da esponja, que nem sei se existe – se não existe, acabo de inventar. As pessoas absorvem as coisas com facilidade, quando percebem que as outras “esponjinhas” estão absorvendo. Em outras palavras, se virou moda gostar de banda colorida, então não gostar é estar fora da moda.

Reparem que eu disse “moda”, e não “modinha”, porque modinha é um termo propositalmente elaborado no diminutivo para dar um sentido pejorativo ao conceito de moda. Moda é legal, modinha é coisa de babaca influenciável.

Mas nem sempre. Citei o exemplo dos beatles, posso citar vários outros. Shakespeare é modinha, pois seus versos fazem a decoração de centenas de milhares de páginas virtuais das redes sociais. Quantas e quantas vezes a pessoa “copia e cola” trecho de um texto de Shakespeare, não porque determinada frase teve impacto em sua vida, mas sim porque...bom, é Shakespeare, e citar Shakespeare dá um ar de intelectualidade. E de tanto citarem, vira modinha. Pobre Shakespeare.

A Teoria Geral da Relatividade é complexa demais pra ser modinha, mas a imagem de Einstein mostrando a língua é.

Há também os ciclos de modinha: a humanidade passou a ser antropocentrista quando Deus virou modinha. Deus retornou em forma “pop” no século XX, daí voltou a estar na moda. Mas no final desse mesmo século, a religião banalizou, e Deus voltou a ser modinha. Pobre Deus.

Agora imaginem duas pessoas quaisquer conversando sobre cinema, quando uma delas pergunta:

 

- Você já viu Avatar?

- Ainda não.

- NÃO VIU AINDA?

 

Estar fora da modinha causa assombro naqueles que estão inconscientemente inseridos nela. Entre este ou aquele círculo de amigos, de qualquer tribo, de qualquer clã, estar de fora da modinha é um crime.

Devo insistir no contraponto: não gostar de algo apenas por ser modinha pode ser uma grande bobagem. É raro, mas às vezes milhões de pessoas estão certas sobre gostarem de uma mesma coisa.

Pode ser uma pessoa, um livro, um filme, uma roupa, uma banda, uma música. Há quem entre na modinha por merecimento. Ser modinha pode tanto ser consequência de sucesso, quanto fruto de um “boca a boca”, geralmente feito por pessoas que estão na fase mais influenciável da vida: a adolescência.

Desconfiem sempre dos adolescentes. Lembre-se, você também já foi um babaca.

Pensei em finalizar esse texto dando como exemplo algo que NUNCA foi modinha...Mas tudo o que me veio na cabeça em algum momento já foi modinha.

 

Hipopótamos já foram modinha...

Pingüins sobre a geladeira já foram modinha...

Cubo mágico voltou a ser modinha...

Cachorros SEMPRE serão modinha...

 

Foi então que pensei num peculiar picolé de berinjela. Que tal? Hein? Taí uma coisa que dificilmente será modinha algum dia, um viscoso e granuloso picolé de berinjela.

Podia muito bem terminar por aqui, é o que eu ia fazer até me dar conta de algo muito mais significativo...

Como eu pude ser tão cego?

A resposta está bem ali, em todos os livros que existem. Em todos os registros históricos. Em todas as nossas lembranças, tempo após tempo, há um vazio que a humanidade desconhece.

A paz nunca existiu. Sempre estivemos em guerra, quente ou fria.

Paz, nunca foi modinha.

Bom, a conversa tem pano pra manga. Mas querem saber? Modinha boa é modinha de viola.

Contanto, é claro, que não vire modinha.

 

 

Diego Gianni

(16/12/2010)

 

 
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